Imagine encontrar em uma mesma sala pessoas de diferentes cantos do país? O caldeirão de jeitos de ser e de viver está inundando o Centro Cultural da UERJ, no bairro Maracanã, Rio de Janeiro, onde acontecem as Oficinas Audiovisuais do Revelando os Brasis – Ano V em preparação para a gravação dos filmes.

Durante o primeiro dia de aula, cada selecionado se apresentou e falou um pouco sobre a história que escolheu para transformar em obra audiovisual. O produtor cultural Augusto César dos Santos, de Meruoca, no Ceará, acompanha o projeto desde a primeira edição, começou a se inscrever na segunda edição e não parou mais.

No último concurso, ele enviou seis histórias. “Acabou sendo escolhida a que eu tinha menos esperança de ser selecionada”, relata o autor da ficção “Sobrou pra Nós”. A história conta como um casal feliz e com uma vida simples tem o seu cotidiano e paz transformados depois que são convencidos a pegar um empréstimo financeiro.

Moradora de Candeias do Jamari, em Rondônia, a vendedora Joelma Silva Ferreira costuma cadastrar as histórias da cidade em um caderno. Com a seleção na quinta edição, ela poderá contar com a ferramenta audiovisual para registrar a memória da cidade. “Foi uma alegria muito grande ser selecionada. Gosto de escrever, participo de encontros de literatura. Também gosto de resgatar e cadastrar as histórias. Espero que o filme saia muito legal porque toda a cidade está esperando”, comemora.

Baseado em fato real, “A Troca” conta a história de um grupo de irmãos pequenos que negocia com indígenas a troca da irmã mais nova por um papagaio, enquanto os pais estão trabalhando em uma colheita no seringal.

Para o professor de literatura Fabiano Silva Ferreira, a oportunidade de participar do projeto é um presente de Deus. “Vi a propaganda das inscrições na televisão e fui incentivado por um irmão a participar. Depois de me inscrever, já comprei a minha mala pra viajar pois acreditei que seria selecionado”, disse.

“Dona Ginu: a maior contadora de estórias de Uruburetama” quer revelar Genoveva Simão de Sousa, a contadora de “estórias”, piadas e repentes da cidade, situada também no Ceará. “Dona Ginu costuma dizer que antes de morrer queria fazer parte dos arquivos da cidade para ser lembrada pelas futuras gerações”, contou Fabiano. Ele pretende realizar este sonho a partir da seleção para o Revelando os Brasis.

“Tirar quebrando, sol na cabeça e levantar as arcas”. Pra quem nunca conheceu uma benzedeira, estes termos podem parecer estranhos e incompreensivos. Diante desta estranheza das novas gerações, um selecionado do Maranhão decidiu ouvir os antigos moradores da cidade para resgatar e divulgar a arte de benzer e curar.

O sociólogo Reinaldo Guimarães, morador de São Domingos do Azeitão, Maranhão, conta que poucos da nova geração se interessam em aprender este conhecimento popular, o que pode levar ao desaparecimento da manifestação. Por meio da obra audiovisual, Reinaldo pretende mostrar para a comunidade uma identidade cultural que ele acredita ser pouco percebida pelos moradores, que não a compreendem. “Meu objetivo é que eles se enxerguem e se vejam”, enfatiza.

A quinta edição também traz relatos biográficos. É o caso de Carlúcia de Melo Soares, moradora de Arraias, no Tocantins. Descendente de escravos e integrante do Quilombo Mimoso, a jovem de 25 anos relatará como enfrentou os maus tratos de patrões, quando atuava como doméstica em Goiânia, e como superou as dificuldades e o preconceito até se tornar uma pedreira respeitada na sua pequena cidade. “Escrevi minha própria história. Sou a única pedreira de Arraias. Com o meu filme, quero mostrar para as pessoas que você pode ser o que deseja”, destaca.

Ao todo, 20 histórias foram selecionadas, reunindo autores de São Paulo, Rondônia, Ceará, Paraíba, Minas Gerais, Tocantins, Maranhão, Rio Grande do Sul, Paraná, Espírito Santo, Santa Catarina, Pará, Mato Grosso do Sul e Rio Grande do Norte.