A comunidade de Nazarezinho, na Paraíba, nunca esqueceu a tragédia ocorrida, nos anos 20, na cidade. Chico Pereira viu seu pai, João Pereira, ser assassinado. Em seu leito de morte, o pai pede ao filho que não procure vingança. Ao encontrar o assassino, Chico o entrega à polícia, mas, por influência política, o criminoso é posto em liberdade. Diante disso, o filho tomado pela revolta alia-se a cangaceiros e vira lenda no sertão nordestino. O homem que matou seu pai é encontrado morto à beira da estrada, porém nunca se provou quem o teria assassinado.
A história transformou-se em lenda no sertão nordestino. Agora, está prestes a ser contada no cinema pela diretora Helena Maria Pereira, moradora da cidade desde pequena, selecionada pela quarta edição do projeto Revelando os Brasis.
Em fase de finalização, o filme “Na Cabeça do Povo” foi gravado nos meses de dezembro e janeiro. O documentário reúne depoimentos dos moradores sobre o que sabem e o que ouviram à respeito da história que sobreviveu à passagem das gerações. Para realizar a obra, a diretora também pesquisou o livro “Vingança Não”, escrito por Francisco Pereira Nóbrega, filho de Chico Pereira.
Mas, Chico matou ou não o assassino do pai?
Há quase cem anos, o mistério intriga a comunidade e divide as opiniões. Segundo Helena, o filme mostrará estas divergências sem apontar para uma posição ou decretar uma sentença para o personagem. Ao contarem o que sabem, os moradores revelarão impressões diferentes sobre o acontecimento até hoje lembrado em prosa e verso pelos artistas locais.
Para alguns, Chico era um herói porque buscou justiça para a morte do pai. Outros o acusam de ter sido um cangaceiro sanguinário que aterrorizou o sertão nordestino com roubos, estupros e assassinatos durante sete anos. Chico foi casado, teve três filhos e morreu aos 27 anos quando sua esposa tinha apenas 17 anos.
Muitos parentes do cangaceiro morreram nos últimos anos, como o filho Francisco, falecido há dois anos. Apesar de outros descendentes ainda viverem no município, apenas uma sobrinha falou sobre o assunto à produção do documentário, mesmo assim preferiu não gravar.
Por meio do projeto, Helena quer contar a saga da família Pereira. “Gosto desta história principalmente a partir do olhar das mulheres da família por tudo o que passaram, como a mãe que perdeu o marido, João Pereira, e depois o filho, Chico Pereira, além da esposa do cangaceiro que se casou aos 14 anos por intermédio de procuração, ficou viúva aos 17 e teve de criar os filhos sozinha”, destaca Helena.
A diretora – Helena Maria Pereira é produtora cultural. Criou a Feira de Artes e Cultura, evento com duração de uma semana cuja programação gratuita inclui oficinas, espetáculo teatrais, apresentações de música e dança, palestras, exibições de filmes e cursos. É responsável também pela criação da Associação Cultural “O Feiraço”, no ano de 2009. A entidade tem por objetivo valorizar a identidade do município como, por exemplo, resgatar a história do cangaço, criar intercâmbio com parceiros culturais de outras cidades para a realização de oficinas e debates. Há três anos vinha refletindo sobre a possibilidade de inscrever a história de Chico Pereira no projeto Revelando os Brasis. No ano passado, tomou coragem e decidiu participar da quarta edição. Helena está entre os 40 moradores de cidades pequenas com até 20 mil habitantes selecionados para transformar histórias em vídeos digitais.